Alterações Climáticas e Energia: as atitudes dos portugueses
Por Luísa Schmidt (ICS) e Ana Horta (ICS)
As alterações climáticas e as questões da energia têm ocupado posições destacadas na agenda política internacional e nacional e colocam desafios cruciais às sociedades contemporâneas. As atitudes e comportamentos das populações sobre estes temas assumem uma importância decisiva para a implementação das medidas e políticas preconizadas, cujo sucesso depende justamente do envolvimento e empenho dos cidadãos.
Neste sentido, o último Inquérito Social Europeu aplicou um conjunto de questões sobre estes dois temas articulados entre si, dado que a mitigação e adaptação ao fenómeno das alterações climáticas (AC) estão directamente relacionadas com a produção e consumo de energia.
Os resultados apontam para um elevado grau de certeza quanto ao facto de o clima estar a mudar com 76,4% dos portugueses a afirmá-lo (Gráfico 1), à frente dos inquiridos d os outros 22 países, os quais maioritariamente também concordam. Sobre as causas das AC os inquiridos em geral atribuem maior peso à acção humana, pondo em segundo lugar a dupla causa dos factores naturais e antropocêntricos. Quanto ao grau de preocupação com o problema está muito claramente generalizado, com os portugueses e espanhóis no topo da tabela. Tal como a noção de que o impacto das AC será negativo e extremamente negativo para o conjunto da população mundial – sendo esta a questão que recolhe mais consenso entre os inquiridos de todos os países.
Gráfico 1. Acha que o clima mundial está a mudar? Respostas dos portugueses ao ESS (2016)
Já ao nível da responsabilidade pessoal para tentar reduzir as AC, cerca de 42% dos portugueses considera-se muito responsável e 27% algo responsável, sendo sobretudo os mais escolarizados que assim o entendem.
A relação entre AC e consumo energético também é patente, com 77% a considerar que a diminuição mundial dos consumos energéticos individuais contribuiria para combater as AC, embora a maioria revele cepticismo quanto a essa possibilidade – quase 60% considera pouco provável que essa redução ocorra mundialmente. Tal como manifestam reticências quanto às políticas públicas de combate às AC à escala dos países: 46% acha pouco provável que um grande número de países tome essas medidas.
À escala do país, os portugueses concordam maioritariamente que se proíba a venda de electrodomésticos menos eficientes (69,4%) e que se usem dinheiros públicos para subsidiar as energias renováveis (66,9%), sobretudo entre os escalões etários mais jovens e mais escolarizados. Contudo, apenas 16,8% concordaria com o aumento de impostos sobre os combustíveis fosseis.
Alinhada com este apoio às renováveis está a preferência muito claramente manifesta pela sua produção em Portugal, com a esmagadora maioria da população portuguesa a considerar que a electricidade consumida no país deveria ser produzida a partir de fontes renováveis – acima de tudo o solar (89%) e a eólica (87%), mas também a hídrica (75%). De novo as gerações mais novas e mais escolarizadas manifestam maior apoio a estas energias (Gráfico 2).
Gráfico 2. Quanta eletricidade consumida em Portugal deve ser produzida a partir das seguintes fontes? Respostas dos portugueses ao ESS (2016)
Tal atitude não será alheia à grande preocupação com a dependência energética do país – 82% estão preocupados e muito preocupados – sobretudo relativamente aos combustíveis fósseis.
Mas mais preocupados ainda (95%) estão os portugueses com a carestia excessiva da electricidade para muita gente (Gráfico 3), o que não é de estranhar num dos países europeus que mais sofre de pobreza energética (como mostra o Observatório Europeu da Pobreza Energética).
Gráfico 3. Preocupação com a energia poder ser demasiado cara para muita gente em Portugal (ESS, 2016)
Em suma, pode dizer-se que, para os portugueses em geral, independentemente do posicionamento político, as AC são uma preocupação instalada, tanto à escala global como nacional– acentuada pelos efeitos ‘geracional e educacional’ que levam os mais novos e mais escolarizados a enfatizarem esta preocupação. Os resultados são, aliás, consonantes com análises anteriores onde se confirmara o papel desempenhado pelas variáveis idade e escolaridade, na modernização do conhecimento e na maior exigência cívica em matéria ambiental por parte das novas gerações. Estas evidenciam níveis de preocupação mais elevados com temas como as alterações climáticas, bem como maior adesão às energias renováveis e à predisposição para a mudança nos consumos.
Depois, constata-se confiança moderada na capacidade de mudança das pessoas e acima de tudo dos Estados quanto à redução do consumo de energia.
O forte apoio colectivo ao investimento em energias renováveis com claros incentivos do Estado à sua produção expressa uma espécie de consenso geral sobre a benignidade das energias renováveis, não poluentes e disponíveis no território (sol, vento, água…).
Por fim, regista-se a preocupação com o custo da energia, o que aponta para um polígono que une 3 problemas do país:(1) níveis alarmantes de pobreza energética em Portugal que se prende, entre outras coisas, à má qualidade do parque habitacional; (2) níveis do que podemos designar como ‘pobreza de conhecimento’ – elevada iliteracia energética e dificuldade da população em aceder a apoios à eficiência energética em casa; (3) pouca confiança no papel dos decisores políticos na promoção de uma racionalidade energética a favor do bem comum.